Todos os dias ela
olhava pela janela do quarto e observava durante alguns poucos
segundos aqueles trabalhadores.
No início, quando
foi obrigada a viver naquele lugar, passava horas vendo aqueles
homens minúsculos mexendo com areia e pedra, mas a desmistificação
da rotina tornou aquele singelo ato em algo estéril, comum, sem um
motivo.
Ao acordar cedo,
tentava passar o maior tempo possível sem pensar em nada, apenas
esperando um segundo suspiro da respiração. Levantava e dava um bom
dia silencioso do alto aos trabalhadores que erguiam dia a dia sua
torre alguns andares a mais e não respondiam pela incapacidade de
escutá-la.
Ela se lembrava
perfeitamente de quando chegou naquele lugar, que até então tinha
pouco mais de oito andares. Agora, pela sua janela, conseguia
enxergar ainda mais distante no horizonte, e se não fosse pelas
densas nuvens cobrindo o mar, poderia imaginar que conseguia enxergar
o outro lado da tempestade.
Mas não.
Eu não posso
confiar em alguém que não fecha os olhos e sonha, alguém que deita
na cama e passa oito horas dormindo sem acordar no outro dia abalado
ou feliz por aquilo que sua imaginação lhe mostrou.
Mas que imaginação
afinal teria ela, que vive num quarto trancado cada vez mais distante
do mundo real? E os andares sobem e sobem, dando a ela a solidão que
acalma e os ventos que empurram, as nuvens passageiras e as
carregadas, até que num alegre vislumbre passamos das nuvens e
estamos frente a frente com o Sol.
Aquele era o momento
de julgar todas as coisas que aconteceram, sem mentiras, apenas uma
sábia reflexão da vida.
Mas não.
A garota que não
sonhava acordou e olhou novamente pela janelinha.
Lá do alto, vários
homens trabalhavam.